A última carta à Maria

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Sabe, Maria...

Não sei se teus olhos pareciam mesmo tanto com a lua, ou se eu que estivera enxergando luz demais nessas tuas jabuticabas. Há muito tempo ando assim, enxergando luz, vendo brilho à toa por aí.

Às vezes também acho que tu me pareces muito com o vento, Maria. Sempre fostes tão etérea e por vezes tão inconstante, por vezes até onipresente. Às vezes te abraçava e sentia como se tu pudesses sumir nos ares como um passarinho, sem que eu sequer percebesse. Quando a brisa entra pelas minhas janelas, Maria, às vezes penso que és tu, voando ao meu encontro. Voando para dentro de mim. Mas também deve ser porque dizem que o amor está em todo canto, Maria; em todos os lugares. E eu te amo.

Então acho que o amor venta. Ele voa, ele invade... ele venta, sim.

Maria, tu te lembras da última vez em que nos vimos? Faz tanto tempo. Tu te deleitavas contando-me as delícias do teu dia, com as maçãs do rosto vermelhas como elas só, repletas daquelas sardas que pareciam pequeninas estrelas no teu rosto de céu. Eu não me recordo de sequer uma palavra do que tu dizias. Mas não fiques chateada comigo, Maria. Não fiques chateada. Não me lembro do que tu dizias, porque tudo em que eu conseguia prestar atenção eram teus lábios, Maria. Ah, os teus lábios... quando tu falavas, eles se fechavam e se abriam tão suavemente, que pareciam as asas de uma borboleta preparando-se para alçar voo sobre as flores.

Eu quis ser uma flor naquele momento. Nunca na vida quis tanto ser algo, Maria. Queria ter sido a flor em que teus lábios de borboleta pousariam.

Muitas vezes, mesmo depois de todos estes anos, fico a me perguntar o que tu és de verdade, Maria; que espécie de ser fantástico és tu. Não podes ser simplesmente humana, não podes ser simplesmente mulher. Estás acima disso, Maria. Estás acima de qualquer coisa que já me tenha feito feliz nesta vida ambígua.

Mas às vezes também me pergunto, Maria, que espécie de ser sou para ti. Pergunto-me se ao menos ainda te recordas de mim. Nunca fui do tipo de sujeito que marca a vida das pessoas, o tipo de sujeito que deixa sua marca em todo canto, que é amado sem fazer esforço.

Na verdade, as pessoas se esquecem de mim facilmente. Elas simplesmente se esquecem. Faça uma semana, faça um mês, faça uma década... elas se esquecem, apenas.

Eu te amo, Maria, lembres tu de mim ou não. Ames tu a mim ou não. Eu te amo e até hoje espero tua brisa entrar pelas minhas janelas e invadir meu peito outra vez.

O amor é livre e por isso ele venta, Maria, assim como tu. Traga-me tua brisa outra vez, volte a atravessar minha vida e eu juro, juro pelo que tu quiseres, que ao voltares encontrarás uma flor no lugar do homem que um dia quisera tanto sê-lo. E meus lábios estarão para os teus, assim como as pétalas estão para o pouso de uma borboleta.

Até qualquer brisa, Maria.






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· 13/12/2013 ·